Semana de 4 dias – Empresa de programas para seguradoras, a RandTech Computing conseguiu aumentar a produtividade interna em 20% ao adotar a semana de quatro dias em Portugal, diz a própria empresa.
Mais seis clientes foram conquistados, três novos produtos foram lançados e a sede foi transferida para uma área central do Porto, importante cidade portuguesa. João Barbosa, responsável pela comunicação da RandTech, comenta as vantagens identificadas com o novo modelo de jornada de trabalho.
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“As pessoas trabalham mais satisfeitas, relaxadas e isso se nota no desenvolvimento de soluções mais criativas, no ambiente e no sentido de pertencimento à marca”, avalia.
A empresa começou a semana de quatro dias em 2022 por conta própria, um ano antes do projeto-piloto coordenado pelo governo com 41 empresas portuguesas. O país europeu segue uma tendência que começa a ganhar força em diversos países e recebeu mais visibilidade nas últimas semanas no Brasil, onde o modelo já foi inclusive testado.
Repercutiu nas redes sociais a proposta de emenda à Constituição (PEC), de autoria da deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP), de acabar com a escala 6×1, com seis dias trabalhados e uma folga somando no máximo 44 horas semanais, e instituir a semana de 4 dias de trabalho, com três dias de folga e 36 horas por semana, sem redução de salário.
Reter talentos
Em Portugal, a tecnologia da informação é um setor carente de mão de obra qualificada. Por conta disso, as empresas estão sempre atrás de talentos. Mas os trabalhadores da área têm refletido se um salário mais alto compensa o aumento do estresse.
“No nosso caso, a medida tem mais efeito na retenção do que na captação de talento. Notamos que os candidatos preferem salários altos a mais tempo livre. Contudo, quem experimenta a medida só aceitaria a reversão com aumentos salariais de 25% a 50%. Quando recrutadores tentam captar o nosso talento, é muito mais difícil terem uma proposta que possa ser comparável”, declara João Barbosa.
Os funcionários da empresa dizem que aproveitam o tempo livre para estudar, fazer voluntariado, esportes, lazer e cuidar da família.
“Temos um casal que coordena as folgas para tomar conta da filha. As pessoas têm a liberdade de marcar a sua folga e têm o bom senso de marcar em dias em que têm compromissos burocráticos e pessoais. Inclusive, quando estão doentes, preferem marcar a folga do que acionar a licença médica”, explica Barbosa.
Teste no Brasil: mais lucro, produtividade e bem-estar nas empresas
O primeiro piloto brasileiro da 4 Day Week, organização que orienta empresas na implementação da semana de quatro dias de trabalho, chegou ao fim, com evento de encerramento realizado em meados de agosto. E os resultados foram considerados excelentes pelos organizadores.
“Todas as nossas expectativas com o projeto se realizaram”, avaliou Paul Ferreira, pesquisador da FGV, durante a cerimônia. Na ocasião, organizadores do projeto e representantes das organizações que participaram do piloto discutiram a experiência e apresentaram os resultados do experimento. A 4 Day Week seguirá monitorando alguns dos participantes nos próximos meses, mas já abriu as inscrições para uma segunda temporada do projeto, que deve começar em janeiro e terminar em julho de 2025.
“Nós vimos uma diferença muito maior na saúde mental dos profissionais no Brasil [do início ao fim do piloto] do que em outros países”, afirma Gabriela Brasil, diretora de comunicação da instituição.
No país, 87% dos participantes afirmam que o fim de semana estendido rendeu mais energia para realizar as tarefas do escritório, enquanto 73% relataram que o sentimento de exaustão decorrente do trabalho diminuiu. Além disso, 71% sentiram mais energia para estar com família e amigos no tempo livre.
Manutenção do modelo
Todas as empresas participantes afirmam que pretendem manter a semana de quatro dias. 46,2% delas vão aderir ao formato de modo permanente; 38,5% delas farão adaptações; e 15,4% vão estender o piloto para incluir mais equipes no esquema, por exemplo.
A 4 Day Week já realizou estudos semelhantes em países como Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Austrália e Nova Zelândia. No Brasil, 252 pessoas de 21 empresas participaram do projeto. Destas, 19 chegaram ao fim, visto que uma companhia do Rio Grande do Sul interrompeu a experiência por conta das enchentes no estado, enquanto outra suspendeu sua participação após ocorrer uma troca na diretoria da companhia durante o período.
Entre os participantes, há empresas de tamanhos e rotinas variados. A Inspira, por exemplo, pequena empresa de tecnologia que atende o setor jurídico, sempre adotou o modelo remoto e teve reuniões semanais. Por isso, foi mais fácil implementar a semana de quatro dias. “Agora, o que vemos são mais colaboradores motivados e menos colaboradores doentes”, conta Carolina Grimadi, líder de produto e UX design da empresa.
Já a editora Mol Impacto, que também é um negócio relativamente pequeno, sentiu dificuldade de encurtar a semana, mas conseguiu. “Por orientação da 4 Day Week, começamos [o piloto] com a nossa equipe mais atribulada, que mais interage com clientes e depende de agendas externas”, explica a CEO da editora, Roberta Faria. “Hoje, é a nossa equipe mais produtiva e organizada”, aponta.
A CEO afirma que a Mol alcançou um nível maior de satisfação com o trabalho e acrescenta que a principal motivação da empresa para implementar a semana de quatro dias não foi a retenção de talentos, mas sim a melhoria na qualidade de vida dos profissionais.
Repensando o expediente
Diretora da Reconnect e responsável pela iniciativa no Brasil, Renata Rivetti defendeu durante o evento de encerramento que a semana de quatro dias é, na verdade, um projeto de aumento de produtividade. “Ele tem muito mais a ver com aprimorar processos e aproveitar melhor o tempo”, afirma a executiva, “do que com transformar a quinta-feira na nova sexta”.
Em agosto de 2023, Rivetti deu uma palestra na sede do Sindpd-SP (Sindicato dos Trabalhadores em Tecnologia da Informação de São Paulo), em São Paulo, e descreveu o projeto e a necessidade de transformar a atual realidade do mercado de trabalho brasileiro.
“O modelo atual não gera aumento de produtividade e têm adoecido mentalmente os brasileiros”, defendeu, na ocasião, Renata. O Brasil é o 1º lugar do mundo em transtornos de ansiedade, 2º lugar mundial em casos de Síndrome de Burnout e o 5º em depressão.
“Tem pessoas que se sentem culpadas por ter um dia extra. ‘Nossa, não estou trabalhando, será que eu sou produtiva?’. A gente foi criada em uma sociedade que hoje acredita que não pode parar. Isso não é produtivo. Ao contrário, está levando a gente para um esgotamento. Essa é uma realidade”.
Durante a fase de preparação e planejamento do piloto, entre setembro e dezembro de 2023, Renata e outros especialistas promoveram workshops e mentorias às empresas participantes, para que elas soubessem como reorganizar o fluxo de trabalho e eliminar gargalos a fim de reduzir a carga horária dos colaboradores e focar nas entregas.
As empresas reduziram, por exemplo, a quantidade e duração de reuniões internas e externas, tornando os encontros mais objetivos. Também definiram com maior precisão as atividades de cada um no escritório, reduziram o microgerenciamento e tentaram melhorar a comunicação dos gestores com seus colaboradores. Além disso, passaram a priorizar certas tarefas em detrimento de outras.
A maioria das empresas participantes conseguiu estabelecer um dia de folga em todas as semanas do piloto, enquanto outras ofereceram folgas quinzenais ou mensais. Em média, a carga horária diminuiu para todos: passou de 42,8 horas semanais para 36,5. O resultado mostra que as participantes conseguiram, de fato, aproveitar melhor o expediente, e que os quatro dias úteis não ficaram mais longos para compensar a folga.
“Para que a semana de quatro dias funcione bem, cada um de nós precisa rever a maneira com que trabalha. Isso significa mudar rotinas e hábitos bem consolidados, não é fácil.”, acrescenta Paul Ferreira, lembrando que a transição para que esse modelo leva tempo e que é normal que haja resistência por parte de alguns empresários, acostumados ao modelo consolidado.
Resultados do piloto:
O lado dos profissionais
– 86% dos participantes afirmam que estão enxergando mais propósito no trabalho;
– 80% notaram melhorias na própria criatividade e capacidade de inovação;
– 71,5% perceberam que a produtividade aumentou significativamente;
– 65,5% afirmam que o comprometimento com a empresa aumentou;
– 60% perceberam que o engajamento no trabalho melhorou;
– 56% afirmam que estão executando projetos de maneira mais satisfatória.
O lado da empresa
– 84% dos executivos acreditam que o piloto foi benéfico para a empresa;
– 83% perceberam melhorias nos processos internos;
– 75% notaram equipes funcionando melhor;
– 63,6% acreditam que a empresa ganhou mais visibilidade com o piloto;
– 63,6% das empresas afirmam que tiveram mais lucro em 2024 (mas a melhoria não pode ser atribuída exclusivamente à semana de quatro dias).
(Com informações de O Globo)
(Foto: Divulgação)
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