Desoneração – A Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira (12) o projeto de lei que propõe uma transição de três anos para o fim da desoneração da folha de pagamentos de 17 setores da economia e para a cobrança de alíquota total do INSS em municípios com até 156 mil habitantes. A proposta será enviada à sanção presidencial.
O Projeto de Lei 1847/24, do Senado, surgiu depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) considerar inconstitucional a Lei 14.784/23, que prorrogou a desoneração até 2027, por falta de indicação dos recursos para suportar a diminuição de arrecadação.
Um acordo posterior foi fechado para manter a desoneração da folha de pagamento em 2024 e buscar fontes de financiamento para os anos seguintes até o fim do benefício, em 2028.
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Assim, o texto aprovado contém várias medidas que buscam recursos para amparar as isenções durante o período de sua vigência, como atualização do valor de imóveis com imposto menor de ganho de capital, uso de depósitos judiciais e repatriação de valores levados ao exterior sem declaração.
A votação ocorreu no prazo final dado pelo STF para a aprovação do projeto que sela o acordo fechado pelo Executivo e o Senado em torno da desoneração e das medidas de compensação. Se o prazo não fosse cumprido, o benefício em vigor deixaria de valer.
Após a aprovação do texto-base em primeiro turno nos últimos minutos da sessão desta quarta-feira (11), a Advocacia-Geral da União (AGU) protocolou ao ministro Cristiano Zanin pedido de prazo adicional de três dias. Segundo o documento, isso seria necessário para que o trâmite seja finalizado e a matéria, sancionada pelo presidente da República.
O impasse em torno da prorrogação da desoneração da folha de pagamento se arrasta há mais de um ano com embates entre o Congresso e o Executivo.
O que é a desoneração da folha
Com a medida, as empresas beneficiadas podem optar pelo pagamento de contribuição social sobre a receita bruta, com alíquotas de 1% a 4,5% em vez de pagar 20% de INSS sobre a folha de pagamento.
Instituída em 2011 para alguns setores, como comunicação e tecnologia da informação, a política de desoneração foi ampliada para diversos setores da economia em 2014, mas sofreu diminuição a partir de 2018 devido à grande renúncia fiscal, permanecendo desde então para 17 áreas.
Em 25 de abril deste ano, o ministro do STF Cristiano Zanin concedeu liminar suspendendo repentinamente a desoneração, o que levou o Sindicato dos Trabalhadores em Tecnologia da Informação de São Paulo (Sindpd-SP) a entrar com um mandado de segurança contra a liminar, temendo demissões em massa e precarização no setor.
“Mudar o regime tributário agora é um desarranjo no sistema muito grande. Vai gerar desemprego e, se mantido isso [suspensão da desoneração], no meu setor que é Tecnologia de Informação vai gerar precarização, vai aumentar pejotização, cooperativas fraudulentas de trabalho. Porque o patrão ele tem um planejamento tributário e ele vai querer se adaptar de alguma forma”, disse Antonio Neto, presidente do Sindpd-SP e da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), na ocasião.
A ação do sindicato foi destaque na imprensa. Relembre algumas das matérias publicadas:
Impasse com o Banco Central
A emenda de redação que foi aprovada pelos parlamentares nesta quarta-feira (12) abre uma exceção ao permitir que os depósitos esquecidos na conta dos bancos possam ser apropriados pelo Tesouro Nacional como receita e considerados para fins de verificação do cumprimento da meta fiscal de déficit zero neste ano.
Esse era o principal objetivo do governo, que quer garantir com as receitas dos depósitos esquecidos o cumprimento da meta. O SVR (Sistema de Valores a Receber), do BC, indica a existência de R$ 8,5 bilhões esquecidos por pessoas físicas e empresas.
O BC, que tinha pedido aos parlamentares que rejeitassem integralmente esse trecho, não ficará obrigado a considerar esse dinheiro como receita nas suas estatísticas fiscais. Especialistas em contas públicas apontam, porém, que a lei do arcabouço fiscal determina que é o BC o responsável em validar se a meta foi atingida.
Em nota técnica distribuída na terça-feira, obtida pela Folha, a autoridade monetária expôs o seu desconforto ao relatar aos deputados que, da forma como estava escrito o dispositivo, haveria risco de entendimento de que estaria obrigado a promover o registro dessas receitas como “superávit primário” no cálculo das contas públicas.
A movimentação do presidente do BC, Roberto Campos Neto, acabou adiando a votação prevista para a terça-feira e gerando apreensão nas empresas e prefeituras beneficiadas pela desoneração.
Ao longo do dia, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, teve que entrar em campo para contornar o impasse gerado por causa da nota técnica do BC. A medida foi incluída na votação que já foi feita no Senado.
Para resolver o impasse, o ministro se reuniu com Lira para que não houvesse uma mudança de mérito do texto, que obrigaria o retorno do projeto ao Senado para uma nova votação, o que Haddad quis evitar.
“O consenso ontem [quarta-feira] foi muito difícil. Mais de 10 anos tentando rever isso e ninguém conseguia. Agora chegou o momento envolvendo o Supremo, o Senado e a Câmara. Chegou o momento de pôr ordem nesse programa, que custou mais de R$ 200 bilhões aos cofres públicos”, afirmou Haddad em entrevista à EBC.
Reoneração gradual
O projeto mantém a CPRB (Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta), que é o nome técnico da desoneração da folha de pagamento, neste ano e, de 2025 a 2027, será feita reoneração gradual em um ritmo de um quarto por ano, até o fim total da desoneração em 2028.
Enquanto a cobrança da CPRB começa a cair a partir do ano que vem, a contribuição sobre a folha de pagamento passa a ser cobrada com alíquota de 5% em 2025; 10% em 2026 e 15% em 2027 – não haverá cobrança do tributo majorado sobre a folha do 13º salário.
Já em 2028, as empresas dos 17 setores hoje beneficiados passam a pagar a contribuição sobre a folha de pagamento de 20%. Esse valor já é cobrado atualmente das demais empresas não beneficiadas pela desoneração.
O projeto estabelece a obrigação de as empresas beneficiadas manterem, pelo menos, 75% do número de empregados durante a vigência do incentivo tributário.
Medidas compensatórias
O texto prevê uma série de medidas de compensação para a perda de receitas gerada pela desoneração da folha. Mas o potencial de arrecadação ainda é uma incógnita, o que levou a equipe econômica a prever alta das alíquotas da CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido) e do JCP (Juros sobre Capital Próprio) no projeto de Orçamento de 2025 para compensar a renúncia fiscal.
O Ministério da Fazenda calcula uma renúncia de R$ 55 bilhões a ser compensada até o fim de 2027, quando o processo de reoneração será finalizado. Integrantes da equipe econômica já avisaram que vão cobrar a compensação integral.
Há medidas como a atualização do valor de bens (como imóveis) na declaração do Imposto de Renda, abertura de um novo prazo de repatriação de recursos no exterior e um Desenrola (programa de renegociação de dívidas) para empresas com multas e taxas vencidas cobradas pelas agências reguladoras.
Também faz parte do texto um corte de despesas obrigatórias e regras que endurecem a legislação para auxiliar o combate à fraude em benefícios como o BPC (Benefício de Prestação Continuada), concedido a idosos e pessoas com deficiência, e o seguro-defeso, pago a pescadores artesanais durante o período em que a atividade é proibida para preservar a reprodução dos peixes.
O texto tem ainda duas medidas para facilitar e agilizar o resgate de precatórios abandonados e outros depósitos judiciais, que podem garantir entre R$ 15 bilhões a R$ 20 bilhões em receitas para o governo federal.
Haddad defendeu que é necessário equilibrar as contas públicas e, por isso, não é possível seguir beneficiando empresas com o poder de lobby no Congresso Nacional, enquanto se cobram cortes de gastos sobre a população mais pobre.
“Você deixa uma grande empresa 10 anos sem pagar imposto e aí, quer fazer o ajuste fiscal em cima do salário mínimo, do Bolsa Família? Alguém tem que pagar a conta, né? Eu sei que tem muito lobby por aí. Não tem lobby de pobre em Brasília”, falou na entrevista à EBC.
Municípios
Quanto aos municípios, permanecerá a alíquota de 8% do INSS em 2024, aumentando gradualmente para 12% em 2025, 16% em 2026 e voltando a 20% a partir de janeiro de 2027.
O benefício valerá para cidades com população de até 156 mil habitantes (em torno de 5300 cidades) e que estejam quites com tributos e contribuições federais.
O projeto exige ainda dos municípios beneficiados que mantenham atualizados os dados cadastrais no sistema eSocial para poderem contar com a alíquota diferenciada e também com a compensação prevista em lei entre o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) e regime próprio de previdência de determinado município, seja ele beneficiário ou não da desoneração da folha.
Em 2024
De 2025 a 2027
Programa de renegociação de multas cobradas pelas agências reguladoras. A Procuradoria-Geral Federal poderá, em juízo de oportunidade e conveniência, propor a transação de forma individual ou por adesão. Os prazos ou os descontos na transação de acordo com o grau de recuperabilidade do crédito. Os descontos poderão ser concedidos sobre o valor total, desde que o valor da transação não seja inferior ao montante principal (originário) do crédito.
Repatriação de ativos mantidos no exterior
Será criado o RERCT (Regime Especial de Regularização Cambial Tributária). O programa permite ao contribuinte declarar de forma voluntária recursos, bens ou direitos de origem lícita não declarados ou declarados com omissão ou incorreção em relação a dados essenciais, mantidos no Brasil ou no exterior, ou repatriados por residentes ou domiciliados no Brasil.
O prazo para adesão é de 90 dias, a partir da data de publicação desta lei. A data de corte para a situação patrimonial é 31 de dezembro de 2023.
O programa vale para empresas e pessoas físicas. O contribuinte que aderir deverá identificar a origem dos bens e declarar que eles são provenientes de atividade econômica lícita, sem obrigatoriedade de comprovação. Sobre o montante declarado, será cobrada alíquota de 15% de Imposto de Renda a título de ganho de capital.
Atualização de bens imóveis
A pessoa física residente no país poderá optar por atualizar o valor dos bens imóveis já informado à Receita Federal para o valor de mercado e tributar a diferença com uma alíquota de 4% do IRPF (Imposto de Renda da Pessoa Física). O pagamento do imposto deve ser pago em até 90 dias contados a partir da publicação da lei.
Já as empresas poderão optar por atualizar o valor dos bens imóveis constantes no ativo permanente de seu balanço patrimonial e tributar com uma alíquota de 6% do IRPJ (Imposto de Renda da Pessoa Jurídica) e de 4% da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido). O pagamento do imposto deve ser pago em até 90 dias contados a partir da publicação da lei.
Combate a fraudes para fortalecer pente-fino do INSS
Pelo lado das despesas, o projeto prevê como medida compensatória da desoneração da folha a redução de gastos com benefícios sociais. O parecer dá força ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) para adotar medidas cautelares para bloquear o benefício.
As medidas cautelares serão adotadas nos casos de o monitoramento dos benefícios apontar irregularidades, como fraudes relacionadas pessoas físicas “criadas” a partir de documentos falsos ou ideologicamente falsos. Identificada a fraude, o INSS poderá fazer o bloqueio imediato do pagamento e suspensão do benefício.
O relatório contém medidas de aperto nas regras do BPC (Benefício de Prestação Continuada), concedido a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda, que já foram baixadas em duas portarias recentes do governo.
A intenção é dar força legal ao pente-fino nos benefícios já anunciado pelo governo Lula. Entre eles, a exigência do registro biométrico, a partir de 1º de setembro. O INSS terá obrigação de informar anualmente os resultados da perícia do BPC antes da elaboração de cada PLOA (Projeto de Lei Orçamentária).
O pescador profissional artesanal que recebe o seguro-defeso também terá que fazer o registro biométrico a partir de 1º de setembro. É exigida, ainda, a checagem prévia de dados em outros cadastros, como o Cadastro Único para concessão do seguro-defeso.
Simplificação de transferência de depósitos judiciais para o Tesouro
A medida viabiliza o resgate mais rapidamente para a Conta Única do Tesouro Nacional dos depósitos judiciais e extrajudiciais que estão na Caixa Econômica Federal. O parecer estabelece regras de simplificação dos procedimentos para a transferência dos depósitos judiciais. Hoje, existe toda uma burocracia que amarra a transferência imediata à Conta Única. A simplificação liberaria uma quantidade grande de valores retidos, que entram como receita.
A Caixa terá de fazer o depósito diretamente na Conta Única do Tesouro e comunicar eletronicamente à Receita. A Conta Única é onde está depositado o dinheiro da União.
Resgate de depósitos judiciais esquecidos, inclusive precatórios
O relator também alterou prazo de resgate de valores abandonados em contas judiciais, entre eles garantias e precatórios. O prazo para a União caiu de 25 anos para dois anos. Após esse prazo, se o recurso não for sacado, a União poderá reclamar o retorno desses recursos para o seu caixa. É uma forma de entrar mais receita para o caixa do governo.
O projeto autoriza o Executivo federal a resgatar recursos esquecidos em contas bancárias pelos brasileiros para reforçar o caixa do Tesouro.
Aumento de Cofins Importação
Até 31 de dezembro de 2024, as alíquotas da Cofins Importação terão aumento de um ponto percentual. O percentual será reduzido gradualmente a cada ano até 2027.
Declarações
De todas as empresas que contam com qualquer benefício fiscal federal, como a desoneração da folha de pagamento, o projeto exige a apresentação de declaração eletrônica à Receita Federal de dados sobre os incentivos, as renúncias, os benefícios ou as imunidades tributárias usufruídas, assim como o valor do crédito tributário correspondente. A regra consta da MP 1227/24.
Além disso, o aproveitamento dos benefícios fiscais passa a ser condicionado à:
A empresa que não entregar a declaração, ou entregar com atraso, estará sujeita ao pagamento de multa, que varia de 0,5% a 1,5% sobre a receita bruta de forma escalonada:
A penalidade, no entanto, fica limitada a 30% do valor dos benefícios fiscais. Além disso, haverá a aplicação de multa de 3% sobre o valor omitido, inexato ou incorreto.
(Com informações de Folha de S.Paulo, Agência Câmara de Notícias e Agência Brasil)
(Foto: Reprodução)
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