Semana de 3 dias de trabalho – A tecnologia pode não substituir os humanos, mas poderia tornar possível uma semana de trabalho de três dias – pelo menos é o que pensa Bill Gates.
O bilionário se juntou a Trevor Noah em seu “What Now?” podcast em um episódio que estreou na terça-feira. Quando Noah perguntou sobre a ameaça da inteligência artificial aos empregos, Gates disse que um dia poderia chegar um momento em que os humanos “não precisariam trabalhar tanto”.
“Se eventualmente chegarmos a uma sociedade onde só temos que trabalhar três dias por semana, provavelmente tudo bem”, disse Gates.
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Poderia existir um mundo onde “as máquinas pudessem produzir todos os alimentos e outras coisas”, e as pessoas não precisassem trabalhar mais de cinco dias por semana para ganhar um salário digno.
Embora a inteligência artificial possa trazer algumas mudanças positivas, Gates já reconheceu os riscos da IA se for mal utilizada. Em julho, ele publicou uma postagem em seu blog sobre o impacto potencial da IA.
“Não creio que o impacto da IA seja tão dramático quanto o da Revolução Industrial, mas certamente será tão grande quanto a introdução do PC. Os aplicativos de processamento de texto não eliminaram o trabalho de escritório, mas o mudaram para sempre”. Gates disse na época. “Empregadores e funcionários tiveram que se adaptar, e o fizeram.”
E Gates não é o único titã dos negócios a prever uma semana de trabalho mais curta. O CEO do JPMorgan, Jamie Dimon, disse que a próxima geração de trabalhadores terá apenas uma semana de trabalho de 3,5 dias devido à IA.
“Seus filhos viverão até os 100 anos e não terão câncer por causa da tecnologia e provavelmente trabalharão três dias e meio por semana”, disse Dimon à Bloomberg em outubro.
Certa vez, Gates considerou o sono preguiçoso e disse a Noah que sua vida girava em torno da Microsoft, dos 18 aos 40 anos. Agora, ele sente que “o propósito da vida não é apenas trabalhar”.
Empresas nos EUA e de outros países têm testado a eficácia de uma semana de trabalho de quatro dias, gerando relatórios positivos sobre a melhoria do equilíbrio e da eficiência entre vida pessoal e profissional.
Semana de 4 dias no Brasil
Em agosto, o Sindicato dos Trabalhadores em Tecnologia da Informação de São Paulo (Sindpd-SP) foi palco de uma palestra de Renata Rivetti, fundadora da Reconnect Happiness at Work, para falar sobre o projeto-piloto da semana de quatro dias. A iniciativa ‘4 Day Week Global’ foi fundada em 2019 e foi testada com sucesso em diversos países como Austrália, EUA, Reino Unido, Irlanda e Nova Zelândia.
O projeto chegou ao Brasil e após inscrições de empresas e um período de planejamento, o experimento começa no início de 2024. O princípio utilizado é chamado de 100:80:100, isto é, 100% do salário, 80% da carga horária prevista e 100% de produtividade.
“É um modelo flexível. As empresas que já começaram a testar esse modelo no Brasil o tem feito através de acordos coletivos com seus funcionários, adequando a proposta para a realidade de cada empresa. Por que não fazer uma jornada diferente? “
Renata contou que o maior experimento ocorreu no Reino Unido, com quase 3 mil pessoas e cerca de 60 empresas, obtendo grande sucesso, com 92% das companhias que participaram do programa aderindo definitivamente à semana reduzida. Não só o aumento da satisfação e da produtividade dos funcionários, mas a redução dos casos de Burnout e de outras doenças mentais foram decisivas para que as empresas mantivessem o modelo após o experimento. As empresas também registraram um aumento em suas receitas durante o projeto.
“O que a gente tem visto desde 2018 é que a semana de 4 dias traz um benefício obviamente para o indivíduo, que ganha um dia extra para cuidar da sua vida pessoal, da sua saúde mental, traz um benefício para a marca empregadora, aumenta a captação e retenção de talentos, aumenta a produtividade e traz um benefício para a sociedade, diminui a emissão de carbono, e faz avançar a equidade de gênero, com mais homens, por exemplo, dividindo as tarefas domésticas. É um caminho para construir uma nova forma de trabalhar”, argumenta.
Maior produtividade
A especialista em felicidade corporativa explica que a ideia surgiu a partir da reflexão de como podemos ser mais produtivos no trabalho. “O quanto que a gente da tecnologia a nosso favor? O quanto a gente pode mais produtivo, trabalhar menos, mas trabalhar melhor? “, indaga Renata, que foi escolhida pela ?4 Day Week Global? como parceira do projeto no Brasil através da Reconnect Happiness at Work, empresa que ela mesma fundou.
“Os dados mostram que atualmente somos produtivos em média de duas horas a três horas por dia. A maioria das pessoas trabalham 8, 9, 10 horas por dia, mas não são produtivos. Excesso de distrações, excessos de reuniões, tecnologia que não é utilizada, comunicação falha. Tem gente que entra no Instagram 10 vezes durante o horário de trabalho. Não seria melhor tem um foco maior no trabalho durante 4 dias e ter um dia extra para fazer o que quiser? Tem um redesenho que pode ser feito para que a gente possa mudar essa semana que existe há mais de 100 anos”, provoca.
“O modelo atual não gera aumento de produtividade e têm adoecido mentalmente os brasileiros”, defende Renata. O Brasil é o 1º lugar do mundo em transtornos de ansiedade, 2º lugar mundial em casos de Síndrome de Burnout e o 5º em depressão. “Tem pessoas que se sentem culpadas por ter um dia extra. ‘Nossa, não estou trabalhando, será que eu sou produtiva’? A gente foi criada em uma sociedade que hoje acredita que não pode parar. Isso não é produtivo. Ao contrário, está levando a gente para um esgotamento. Essa é uma realidade”.
“No final, isso é ruim para o indivíduo, pois deixa marcas, traumas, mas isso também é ruim para a empresa, com alto índice de Turnover, com o Burnout, que traz consequências graves”, aponta. Tal esgotamento causa desinteresse no ofício, e um relatório mostra que somente 23% das pessoas estão engajadas no trabalho.
“Não é 60%, 70%, são 23%, as pessoas estão cansadas, estão sobrecarregadas, as pessoas estão chegando no seu limite e isso custa para economia global quase bilhões de dólares por ano. Do jeito que está, não está bom para ninguém”.
Novas gerações e pós-pandemia
O fato de que as novas gerações estão mais preocupadas com a sua qualidade de vida e menos tolerantes com abusos – como o assédio – no ambiente de trabalho também contribui para a necessidade de uma mudança de paradigma. A pandemia, acrescenta Renata, mudou a percepção da sociedade sobre a busca da felicidade e sobre como cada pessoa gasta seu tempo.
“As novas gerações trazem essa reflexão: ‘Eu não quero viver para trabalhar. Eu quero que o trabalho seja parte da minha vida. Não quero um trabalho que custe 100% do meu tempo’. A busca desse equilíbrio entre vida profissional e vida pessoal”.
A fundadora da Reconnect Happiness at Work afirma que a semana de 4 dias gera um aumento de performance dos funcionários, que ficam mais focados no trabalho para entregar as demandas esperadas e assim, terem acesso ao dia extra de descanso. “Esse modelo gera também uma maior relação de confiança nas empresas, onde as pessoas contam umas com as outras. Isso também reduz práticas abusivas dentro das companhias”.
Com um dia livre na semana, as pessoas tendem a cuidarem melhor de si, da saúde mental e também da saúde física, fazendo exercícios, ficando com suas famílias e assim, tendo um ganho significativo na qualidade de vida. Mais felizes, as pessoas trabalham melhor e produzem mais. Além disso, a empresa que oferece uma semana de 4 dias se torna atrativa para captar e reter talentos do mercado de trabalho. “É ‘ganha-ganha’. Tem mitos, medos, mas no final, todo mundo ganha. É um redesenho da semana de trabalho. Dá trabalho, mas no final, compensa”, diz, lembrando que nos EUA, 100% das empresas mantiveram o modelo 100:80:100 ao fim do projeto.
Após o fim das inscrições, ‘4 Day Week Brasil’ entrou na fase de planejamento e deve iniciar o experimento – que dura seis meses – no início de 2024. “Se a gente for esperar o momento perfeito…qual que o momento perfeito? A gente que tem que construir o mundo que a gente quer. A gente tem que lutar por aquilo que a gente acredita”, finaliza Renata Rivetti.
*Parte do texto foi traduzido de matéria publicada por Business Insider
(Foto: Reprodução)
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